O superávit estrutural por definição, é a estimativa de desempenho orçamentário compatível com o PIB potencial de longo prazo e com preços de ativos negociados nos valores tendenciais, excluindo-se os efeitos de receitas e despesas julgadas “não recorrentes” (i.e., de caráter contábil ou temporário). (SALTO, 2016 p. 257).
Essa definição de superávit estrutural dada por Maurício Oreng, extraída do livro “Finanças Públicas” nos mostra uma forma de avaliar – corretamente – as contas públicas do governo.
Enquanto no Governo Dilma Rousseff a postergação de quitação de passivos da União mantinham resultados primários artificialmente positivos, no governo Temer, a entrada de recursos extraordinários está exercendo influência positiva nas receitas, mascarando o já demasiado déficit primário.
O gráfico acima mostra a evolução dos saldos primários do governo consolidado pela ótica na necessidade de financiamento do setor público (NFSP). Fica evidente um aumento da poupança do governo desde 2002, salvo pela mudança da trajetória em decorrência dos efeitos da crise dos subprimes em 2008 e, posteriormente, um agravamento na capacidade do governo de gerar poupança em decorrência dos efeitos da crise nacional.
Apesar dos recordes negativos – o déficit primário de setembro (R$ 22,7 bilhões) foi o segundo pior em duas décadas – o aumento do déficit público passa a mostrar, a partir de 2017, uma interrupção na elevação desses passivos. Vejamos o porquê:
- O déficit de setembro de 2017 teria sido ainda pior caso as receitas não tivessem tido um incremento de R$ 8 bilhões ou 8,3% das receitas brutas;
- Apenas em setembro de 2017 as receitas não recorrentes atingiram R$ 7,2 bilhões, o dobro das receitas não recorrentes arrecadadas em setembro do ano anterior;
- Somam-se aos R$ 7,2 bilhões, os parcelamentos de dívidas mais recentes e da dívida ativa R$ 3,7 bilhões;
- Receitas com outorgas e concessões: R$ 5 bilhões;
- Repatriação: R$ 1,6 bilhões;
- PIS/Cofins sobre combustíveis: R$ 4,1 bilhões.
Em suma, segundo levantamento do Instituto Fiscal Independente (IFI), os recursos não recorrentes atingiram R$ 38,4 bilhões de janeiro a setembro deste ano, o que representa algo em torno de 4% de toda a receita administrada pela Receita Federal do Brasil (RFB) no período. No mesmo período e nos mesmos termos, no ano passado o montante foi de R$ 45 bilhões, ou 5,03% das receitas administradas pela RFB.
O mesmo relatório da IFI mostra que apesar dos sensíveis efeitos da arrecadação extraordinária, houve, nos últimos meses, alguma melhora da arrecadação recorrente, associada a uma incipiente melhora da atividade econômica nacional, tal como pode ser visto no gráfico acima.
O tímido aumento da arrecadação, no entanto, não tendo sido suficiente para anular os efeitos do crescimento das despesas primárias. De janeiro a outubro deste ano as despesas primárias acumuladas foram de R$ 1,035 trilhão, ante R$ 1,024 trilhão registrado no mesmo período do ano passado, aumento real de 1,02%.
De acordo com o Banco Central, de novembro de 2016 a outubro de 2017 o déficit primário do setor público consolidado foi de R$ 187,2 bilhões, muito acima da meta anual que foi fixada em R$ 159 bilhões. O resultado, no entanto, não transmite com a máxima clareza a real situação das contas públicas do Brasil.
Parte das receitas primárias vem até os cofres do governo de forma extraordinária e isso acaba por influenciar positiva ou negativamente quando a intenção é avaliar a eficácia da política fiscal do país.
Pelo caráter de políticas fiscais tão distintas e ciclos econômicos mundiais tão bem desenhados e de enorme influência sobre a economia nacional, é necessário que se façam sempre olhares distintos sobre o desempenho fiscal do Brasil. Um olhar sob uma “nova ótica” permite que o governo e/ou agentes façam mudanças em suas rotas, antevendo problemas e soluções para os mesmos.