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Whatsapp, Estado, Direito e Economia

Na terça-feira (19), a juíza Daniela Barbosa Assunção de Souza, de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense (RJ) determinou o bloqueio do aplicativo de mensagens instantâneas Whatsapp até que eles fornecessem dados de uma conversa para uma investigação que apura ações de uma organização criminosa

No mesmo dia, à tarde, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, suspendeu a decisão da juíza. Ainda durante aproximadamente cinco horas, o país ficou sem acesso ao aplicativo.

Essa foi a terceira vez que o aplicativo foi bloqueado no país e o caso trouxe a tona diversas reflexões. De todo modo, importante fazer uma ressalva.

O especialista em Direito Digital da FGV Daniel Vargas em entrevista ao portal G1, destacou que o mundo inteiro tenta uma saída para este impasse, entre o direto à privacidade e as investigações que apuram as ações de criminosos.

Mas para além desse impasse, há uma questão inerente a esse caso que envolve diversas “áreas”: tecnologia, Direito, Estado, grandes corporações e, claro, a economia.

Bem, em diversos momentos nesse espaço já tratamos sobre a tecnologia (como aqui, aqui, aqui e aqui). Definindo-a em poucas palavras, ela “envolve o conhecimento técnico e científico e a aplicação deste conhecimento através de sua transformação no uso de ferramentas, processos e materiais criados e/ou utilizados a partir de tal conhecimento”.

O seu desenvolvimento traz importantes ganhos (ou, num jargão econômico, externalidades positivas) para a economia como um todo (e, obviamente, aí incluídos os meros mortais, como nós).

A evolução da comunicação, por exemplo, tem impactado diretamente o mundo que vivemos desde sempre, mas, com desdobramentos mais significativos desde o início da década de 90, com o advento da internet e as chamadas TIC’s (tecnologias da informação e comunicação).

Essa evolução, também conhecida como inovação e entendida como o processo de criação de técnicas, produtos ou serviços novos, tem relação direta com a tecnologia. São justamente os processos inovativos, de construção de novos padrões técnicos e científicos, que determinam o nível tecnológico e condicionam o nível industrial.

Na atualidade, diante de intensa evolução tecnológica, a busca incessante por inovação tornou-se sinônimo de desenvolvimento econômico, ou seja, de bem-estar, qualidade de vida, distribuição equânime de recursos, dentre outras características.

De todo modo, após esse preâmbulo, a questão central que mais importa aqui não é a tecnologia em si e seus desdobramentos, mas as corporações por trás dessas inovações e sua relação com o Estado.

Enquanto discutíamos como escrever esse editorial e anotávamos sugestões de como deveria ser a imagem de capa (se o “juiz” seria representado pelo Whatsapp ou pelo Brasil) ficamos com muitas dúvidas. Optamos por manter como está acima. Mas com ressalvas.

Não nos convém tecer afirmações aqui, mas levantar hipóteses. E, para isso, a primeira questão que se impõe é: quem está certo, parte do Judiciário brasileiro que demanda acesso às informações protegidas, ou a empresa, que as protege sobre o pretexto das “liberdades” (de informação, de comunicação, de expressão etc.)?

Nossas contribuições para o debate são basicamente duas.

Temos destacado em alguns de nossos relatórios para nossos clientes uma possível “ditadura do judiciário”. O termo destaca um desequilíbrio de forças entre os poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário).

Essa “ditadura” fica evidente no poder exacerbado, sob nosso ponto de vista, que o Judiciário brasileiro tem mostrado em diversas operações e nos “mandos e desmandos” no país.

Falamos do Whatsapp aqui, pois é o caso mais recente e que permite colocar em voga estas questões.

Mas o “embróglio” não se restringe a ele. Não podemos esquecer, por exemplo, que o Uber gerou (e ainda gera) calorosos debates. E ainda que os problemas não sejam diretamente com o Judiciário, mas é com a figura do Estado.

E aí, mais uma vez, é bastante elucidativa essa relação entre Estado e iniciativa privada, em especial, as empresas inovativas.

No caso do Uber, a inovação criada permitiu redução das tarifas do transporte (em comparação aos concorrentes – os táxis), maior alcance e, por conseguinte, encontro da oferta e da demanda, bem como maior “produtividade” do transporte.

Os problemas, contudo, se deram quando a inovação entrou em conflito com a “tecnologia anterior”, ou seja, quando o Uber se confrontou justamente com seus concorrentes – os taxistas.

Não nos cabe julgar qual lado está certo ou errado, mas propor a reflexão de como lidar com isso. As inovações trazem ganhos profundos a toda a sociedade, contudo, precisamos produzir debates sérios e propositivos nesse sentido.

Por exemplo: olhando para o Brasil e considerando que aproximadamente 1/3 da população tem o hábito de planejar o futuro (e planejar não inclui necessariamente fazer poupança ou pensar na aposentadoria); além disso, tendo em vista que os motoristas do Uber não são “trabalhadores registrados”, essas pessoas terão seus direitos previdenciários resguardados?

Essa é uma questão significativa que deve ser levada em consideração. De todo modo, a briga entre os grupos de interesse e o Estado segue.

Voltando para o Whatsapp, além da relação entre a empresa e o Estado, também há uma briga de interesses que é bastante evidente: o oligopólio da comunicação (veja aqui e aqui) e a empresa inovativa.

Importante resgatar um ponto que ressaltamos recorrentemente em nossas interpretações: o Estado é a amálgama de frações de classe, portanto, os grupos mais bem organizados conseguem ter seus interesses resguardados.

E isso significa que, infelizmente, não necessariamente os interesses resguardados são os interesses da maioria, como se propõe que funcione uma democracia.

O caso do Whatsapp é, mais uma vez, emblemático. O bloqueio impactou o país inteiro.

Nossa leitura deste caso é de que, ceteris paribus, nessa já citada amálgama de interesses que compõem o Estado, os interesses do oligopólio das telecomunicações está devidamente resguardado.

Uma das razões é que a evolução das TIC’s demandam grandes investimentos em infraestrutura. Para o Whatsapp e outras inovações funcionarem devidamente, é necessário que haja uma estrutura adequada.

Mas as empresas que dominam o setor estão “um passo atrás” nesse sentido (vide os serviços de má qualidade prestados no país).

Bem, essa reflexão vai longe. Ainda abordaremos essas temáticas em outros momentos.

De todo modo, o que nos interessa aqui é provocar o leitor a pensar nessa complexidade de relações e interesses que estão por trás do Estado, do Judiciário em especial, das empresas e, obviamente, dos desdobramentos das inovações tecnológicas.

Dúvidas, críticas e sugestões? Entre em contato conosco!

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